domingo, 6 de fevereiro de 2011

Do lado de lá das muralhas

Cada vez mais eu percebo que é em vão eu tentar descrever a pureza e o sentido das coisas. Tal como a luz da madrugada pintada e musicada por uma garoa macia, macia como o colo aconchegante de mãe.
Eu me repetiria embora as emoções que essas imagens e sentidos me trazem sejam exclusivas, inéditas.
A mágica está presente, viva nas poesias dos insetos da noite, na imaginação a que eles me remetem. Está nas lembranças que tenho de quando tinha dúvidas, de quando indagava a si mesma se seria possível deitar na grama enquanto o planeta dormia pra que a lua se aproximasse de mim sem vergonha e eu pudesse, então, admirar suas crateras com cuidado.
Eu gostaria ainda de ter dúvidas, dúvidas quanto a coisas boas. Talvez as tenha, talvez as cultivasse melhor e sentisse mais a vida se não tivesse tanto desejo de vivê-la e compreendê-la.
Sou eu agora e a madrugada. Eu e o conforto do quarto. Eu e os grilinhos, e esse amor que me desperta o instante. Sou eu e um pouco ainda das coisas que morderam a paz da semana, eu revendo sem querer rever, escrevendo sem querer escrever o que martela a cabeça, o que deixa escapar pra si pedacinhos de tristeza...
Mas existem continuações, hoje eu juntei passagens de coisas que aconteceram no decorrer de dezoito anos e algumas semanas. Eu pude entender que eu fui forte de verdade dezenas de vezes, e que hoje eu sou mais. Que o que há de ruim em cada tão pouco a junção de decepções e mágoas vividas não merecem extensão, não vão ser convidadas nem empurradas pro meu presente, não vão diminuir minha esperança e afetar os meus mais preciosos sonhos. 
Continuo a ser quem fui, na essência. Minha verdade e meus valores são de enorme importância pra mim e não é pessoal, não é inteiramente voluntário que eu continue a arrancar toda a verdade do meu peito mesmo à quem me pisa, à quem inventa, à quem machuca. Machucaria incontáveis vezes mais e machucou quando eu tentei ocultar. É porque a minha alma me deixa descansar tranquila à noite independente do que as pessoas acreditem, independente das coisas contrárias que me disseram. Seria bom que as pessoas de que gosto tanto não se deixassem contaminar por desconfianças e absurdas proteções, seria bom se não entendessem palavras que saem do peito como ironia ou deboche. Seria bom se eu já soubesse lidar com isso, mas é bom que eu tenha esperança e persistência, que eu busque aprender a conviver com gritantes adversidades. É maravilhoso que elas ainda me aceitem assim, resistente, sem querer mudar por egoísmo, pra manter minha consciência em paz.

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